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Research Article

Do Japão a Portugal, por via de Espanha? Os Primeiros Romances Japoneses no Mercado Português

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Pages 173-188 | Published online: 01 Feb 2024
 

ABSTRACT

The first Portuguese translations of Japanese novels date from 1906 and 1909, respectively: Nami-ko (Hototogisu) by Tokutomi Kenjirō (1868–1927) and Os 47 Capitães (Iroha Bunko) by Tamenaga Shunsui (1790–1843). These novels, which mark modern Portugal–Japan literary relations, were published without any identification of their source language. Both translations appeared, however, one year after their Spanish counterparts, which in turn are based on English direct translations from Japanese (Nami-ko, 1904; The Loyal Ronins, 1880). The proximity of publication dates of the Portuguese and Spanish translations, the working languages of the Portuguese translators, and the juxtaposition of peritextual elements between the Portuguese and Spanish translations suggest that the latter may have served as the basis for importing Japanese novels into Portuguese. Framed within the external history of translation and based on a paratextual approach, this case study interrogates the pattern of double indirectness underlying the introduction of the Japanese novel in Portugal. By questioning to what extent neighbouring Spain, as a mediation system, helped shape the openness of the Portuguese literary system to Japanese literature, it will clarify the early twentieth-century relations between the Portuguese and Spanish publishing markets in terms of the influence of the latter on the former.

Notes

1. O japonólogo Sepp Linhart identifica Sechs Wandschirme in Gestalten der vergänglichen Welt como a primeira tradução europeia de uma obra japonesa pela mão do tradutor austríaco August Pfizmaier (1808–1887). Trata-se da versão alemã de Ukiyogata rokumai byōbu (1821), de Tanehiko Ryūtei (1783–1842), sem tradução portuguesa (Hanawa Citation2018; ver página de apresentação do departamento de Estudos Japoneses da Universidade de Viena: https://japanologie.univie.ac.at/en/about-us/history-and-fields-of-study/).

2. Até à data, identificaram-se apenas dois textos — contos — anónimos apresentados como japoneses e com publicação, em Portugal, anterior a estes romances, a saber: ‘O pastor de carpas. Imitado do japonez’, incluído no n.° 8 do Gabinete de Leitura: semanario das familias. Romances illustrados de todas as Nações (ano 1.°, vol. I), de fevereiro de 1884, e assinado pelo tradutor Carlos Richard (a 30 de junho de 1902 o mesmo conto é republicado na revista ilustrada O Occidente); ‘As borboletas (conto japonez)’, com impressão a 09 de agosto de 1896 na revista Branco e Negro.

3. Assina outras traduções folhetinizadas no Diario Illustrado, tais como ‘O contracto do diabo’, em 1904, de Arsène Houssaye, e outras inscritas na rubrica ‘Historia de doze mulheres’ em 1905.

4. Em Portugal, foram vários os comentadores da guerra russo-japonesa. Wenceslau de Moraes (1854–1929), oficial da marinha portuguesa e escritor que, a partir de 1899, se exila no Japão, noticiou a guerra de forma regular na imprensa portuguesa, aplaudindo a vitória sobre a Rússia como o triunfo asiático sobre o imperialismo ocidental. Numa das cartas que assinou n’O Commercio do Porto, Moraes afirma que ‘[o] Japão, perante o mundo, passou de um país de quimeras para um país de heróis; o que o coloca na vanguarda das potências de primeira ordem, respeitado, temido; o que lhe dá imenso prestígio no seio da família asiática, onde tem de formar a sua hegemonia futura’ (1985, 148).

5. ‘Assombro é a nota dominante no discurso de todos os diplomatas que durante este período [1903–1952] cumpriram funções no Japão: espanto pelo esforço japonês, primeiro em se modernizar à luz dos preceitos civilizacionais do Ocidente, depois em prosseguir na determinação imperialista’ (Ana Fernandes Pinto Citation2019, 136).

6. No entender de Wenceslau de Moraes, suspeito pela sua simpatia pela cultura japonesa, ‘[o] perigo amarelo é, primeiro do que tudo, o perigo, que a Europa e a América já prevêem, dos [sic] asiáticos, conscientes enfim do seu direito e da sua força, oporem tenaz resistência à série de injustiças de que vão sendo vítimas’ (Moraes Citation1985, 55; ênfase do original). Neste período finissecular, proliferam, no mercado livreiro nacional, obras não traduzidas que tematizam o Japão, desde ensaios políticos a impressões de viagem, crónicas, memórias, relatos de costumes e ficção também. Além dos trabalhos de Wenceslau de Moraes, vejam-se, a título de exemplo: A Estada no Japão, de Júlio Ferreira Girão (Typ. Século XX de Silva & Silva, 1901); O Japão por Dentro: esboço analitico da civilização nipónica, de Ladislau Batalha (Parceria António Maria Pereira, 1904); o romance A Estrella de Nagasaki, de António de Campos Júnior (João Romano Torres, 1907); a pseudotradução Cartas de um Japonez: de Lisboa para Tokio (critica d’um oriental ácerca do nosso paiz), de Alfredo Gallis (Parceria António Maria Pereira, 1907); Politica Japonesa: imperialismo e democracia, de César de Sousa Mendes (Coimbra Editora, 1916); ou a separata Nas Terras do Chá: notas, silhouetas, impressões, de Francisco Trancoso (Imprensa da Universidade 1917).

7. Traduziu textos como Um Collega: comedia em 1 acto (1906), de Élie de Bassan; Louras e Castanhas: comedia em 1 acto (1908), de Charles Brillaud de Laujardière; ou O Rei dos Gatunos, de Francis de Croisset e Maurice Leblanc, com apresentação a 20 de janeiro de 1912 no teatro Ginásio, em Lisboa.

8. Relembre-se que este periódico noticiava desde, pelo menos, 1903 sobre cultura, usos e costumes do Japão; Wenceslau de Moraes foi o principal responsável por esse exercício de mediação cultural, colaborando com a Serões entre 1904 e 1911.

9. Para aprofundar possíveis motivações para a retradução importaria fazer uma análise textual comparada de ambas as versões. De acordo com a hipótese de retradução postulada por Antoine Berman (1990 in Gürçağlar Citation2020, 485), as primeiras traduções serão mais domesticantes, enquanto as traduções subsequentes serão mais estrangeirizantes. Note-se, a título de exemplo, que a tradução de Couto Nogueira mantém as mesmas notas de rodapé que a tradução folhetinizada, as quais não têm autoria, acrescentando-lhes, porém, três notas de tradutor — identificadas pela sigla ‘(N.T.)’. Essas notas evidenciam a natureza traduzida do texto, clarificando termos estrangeiros e salientando a distância entre a cultura do Outro asiático e a cultura de chegada.

10. Utilizou-se o catálogo PORBASE — Base Nacional de Dados Bibliográficos (https://porbase.bnportugal.gov.pt/) para fazer o levantamento da sua atividade tradutória, não obstante a deteção de alguns erros de datação.

12. Na altura, a editora funcionava ainda como Livraria Editora Guimarães, Líbano & C.ª.

13. Esta lenda foi adaptada para cinema por Carl Rinsch, em 2013 — 47 Ronin.

14. César dos Santos menciona estes movimentos de acumulação de conhecimento, referindo-se aos ‘letrados [que] se enfronhavam na cultura ocidental, freqüentando Universidades, Institutos e Academias, com subsídios do Govêrno’ (1945, 107).

15. Matsuda (Citation1965, 63) indica o ano de 1902 para a primeira visita de Murakami a Portugal em representação do Departamento Japonês para a Educação, com o objetivo de estudar a história das relações entre os dois países. Num artigo de opinião mais recente, publicado na revista ípsilon, Murakami é apontado como o descobridor, em 1903, de uma cópia de Doctrina Christan, impressa em Amakusa em 1592, no Liceu Passos Manuel, em Lisboa (Santos Citation2014). É assim legítimo balizar a estadia de Murakami Naojirō, em Portugal, entre 1902 e 1905.

16. The Influence of Early Intercourse with Europe on the Japanese Language (1906) lista empréstimos da língua portuguesa patentes no japonês, fazendo-os acompanhar de equivalentes em inglês e observações a respeito da sua etimologia. Murakami manteve contacto com intelectuais portugueses, correspondendo-se com o sanscritista e filólogo Sebastião Rodolfo Dalgado, que utilizou o estudo de Murakami para o seu Glossário Luso-Asiático (1913). Em 1927–1928, foi publicada a sua tradução japonesa das Cartas dos missionários jesuítas do Japão, impressas em Évora em 1598: Yaso-kaishi Nihon tsūshin, em dois volumes.

17. Ver a peça publicada a 01 de fevereiro de 1901 na Gazette des beaux-arts a propósito da presença japonesa na Exposição: https://gallica.bnf.fr/ark:/12148/bpt6k203153c/f29.item.

18. Segundo Soriano e Madrid (Citation2016, 16), a casa editorial foi fundada em 1900, após aquisição de imprensa própria em 1896.

19. Ver também a página em linha, de autoria anónima, sobre a Maucci: https://www.montereggio.eu/paese_librai/Librai/maucci.htm.

20. Em 1905, houve uma nova edição pela Maucci, ‘segunda edición revisada y notablemente corregida’. Fora da Península Ibérica, registou-se uma publicação de Nami-ko, também em 1905, pela Sociedad ‘Imprenta y Litografía Universo’, com sede em Santiago do Chile e Valparaíso (Tokutomi Citation1905; ver https://archive.org/stream/namikonovelapop00tokugoog#page/n8/mode/2up).

21. Não nos foi possível aceder a um exemplar físico da edição espanhola de 1904 (as imagens reproduzidas neste artigo foram retiradas de sítios de venda de livros em linha), e a capa do exemplar português, consultado na Biblioteca Nacional de Portugal, está relativamente puída.

22. Janeira afirma-o em Portugal e o Japão — Subsídios para a história diplomática (Agência Geral do Ultramar, 1955), cujo excerto se consultou a partir de http://armandomartinsjaneira.net/downloads/Armando_Martins-Portugal_e_o_Japao-excertos.pdf.

23. Funcionou como espaço de tertúlias, acolhendo personalidades ligadas sobretudo ao mundo da literatura, da arte e do colecionismo (Real Academia de la Historia Citation2018).

24. Citações extraídas, a título exemplificativo, do texto promocional de Los 47 Capitanes cons-tante do paratexto de uma obra do catálogo de Francisco Beltrán, neste caso Tinieblas en las cumbres (1920), de Ramón Pérez de Ayala, disponível em https://archive.org/details/tinieblasenlascu00prez/page/n395/mode/2up?q=mar (acedido 22 fev. 2022).

26. A capa de Os 47 Capitães pode, no extremo, servir a captação de leitores do sexo feminino, precisamente por conotar uma sensibilidade de índole feminina.

27. Ver, por exemplo, a de Matsuo Bashō, O Caminho Estreito para o Longínquo Norte (1987), traduzido por Jorge Sousa Braga. Estes dados foram recolhidos no âmbito do projeto de pós-doutoramento Bridging East and West: A Critical Chronology of Published Translations from Japanese into Portuguese (1543–2014), financiado por fundos nacionais através da Fundação para a Ciência e a Tecnologia, I.P., ao abrigo da bolsa individual de pós-doutoramento SFRH/BPD/99430/2014.

Additional information

Funding

This work was supported by the Fundação para a Ciência e a Tecnologia [SFRH/BPD/99430/2014].

Notes on contributors

Marta Pacheco Pinto

Marta Pacheco Pinto (PhD in Translation History, 2013) is Assistant Professor at the School of Arts and Humanities of the University of Lisbon. She is a member of the Centre for Comparative Studies at the same university, where she carried out a postdoctoral project on the published translations from Japanese into Portuguese (1543–2014) and coordinates the project ‘MOV. Moving Bodies: Circulations, Narratives, and Archives in Translation’. She was the principal investigator of the ‘TECOP. Texts and Contexts of Portuguese Orientalism – International Congresses of Orientalists (1873–1973)’ project, which was funded by the Portuguese research council in 2016–2019 (PTDC/CPC-CMP/0398/2014). Her research interests range from the history of translation in connection with Portuguese Orientalism to genetic translation studies. Recent publications include the coedited books Reframing Translators, Translators as Reframers (Routledge, 2022); Genetic Translation Studies: Conflict and Collaboration in Liminal Spaces (Bloomsbury, 2021); and Iberian and Translation Studies: Literary Contact Zones (Liverpool University Press, 2021).

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